Os aniversariantes
Na maior parte dos casos, o segundo colocado em alguma disputa é tão lembrado pela posteridade quanto o último, ou o quarto. Uma honrosa (ele certamente gostaria do adjetivo) exceção é Robert Falcon Scott, comandante da segunda expedição a alcançar o Pólo Sul, um mês após a primeira, liderada por Roald Amundsen. Moral: para ficar conhecido, um fracasso espetacular pode ser mais eficiente do que um sucesso discreto.
O planejamento da excursão de Scott ao Pólo Sul foi desastroso do começo, com a escolha de pôneis em detrimento dos cães, ao fim, quando os quatro homens que fariam a última marcha rumo ao pólo se transformaram em cinco. Scott é o símbolo máximo do amadorismo esportivo britânico no começo do século XX, e a metáfora perfeita para explicar o declínio desse amadorismo. Sua morte, em março de 1912, a onze milhas de distância de um acampamento cheio de víveres, prenuncia o choque de realidade que a Europa receberia alguns anos depois, quando a guerra deixaria de ser um nobre chamado pela defesa da pátria para se tornar aquela coisa suja em que tanta gente morre. Remarque devia detestar Scott.
Os aniversariantes, de Beryl Bainbridge, recria a última expedição de Scott desde a saída do Terra Nova de Cardiff até a morte de Titus Oates no retorno do Pólo Sul, passando pela "pior viagem do mundo", a expedição de três homens ao Cabo Crozier. Cada parte da viagem é narrada por um dos cinco homens que chegaram até o pólo e morreram tentando voltar. Às vezes Bainbridge resolve mostrar os frutos de sua pesquisa em momentos inapropriados - por exemplo, quando o sargento Evans discorre sobre a personalidade de Scott e busca explicações na vida de família do comandante - mas é um defeito menor num livro muito bem escrito.
Bainbridge é uma partidária de Roland Huntford, autor de O último lugar na Tarra, para quem Scott era um idiota arrivista que levou seus companheiros à morte. Há controvérsias: Susan Solomon, num livro que ainda tenho que ler, defende que os ingleses de fato enfrentaram tempestades e temperaturas incomumente inóspitas na sua viagem de retorno. De qualquer forma, as opiniões de Bainbridge não tornam o livro melhor nem pior.
A melhor coisa do romance é a sensação de impending doom que o permeia, sem que Bainbridge precise fazer muito esforço: basta o fato de sabermos que no fim aqueles cinco homens estarão mortos. Como quando assisti a Domingo sangrento, queria que de alguma forma os eventos fossem alterados, ao mesmo tempo em que sabia que não havia escapatória - e, um pouco mais perverso, que só estava lendo aquele livro por causa da tragédia que não queria que acontecesse. É uma ótima escolha fechar com a narração de Oates, o segundo a morrer, e deixar os três restantes agonizando na neve. Um fim triste de dar pena, que me deixou com vontade de poder aconselhar aquele pessoal antes da viagem. Esqueçam os cavalos. Levem muitos cães.
3,5/5
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