Debaixo da Cama
Uma cama larga, simbolizando o país. Sobre a cama, não me pergunte como, um reacionário, simbolizando as classes dominantes, sua mulher frívola e infiel, simbolizando a incosciência nacional, e um doido, simbolizando um doido. Fala o doido:
-Esse ruído...
-Que ruído? Pergunta o reacionário.
-Debaixo da cama.
-Não ouvi ruído nenhum.
-Exatamente. Não é estranho? O jacaré está quieto.
-Que jacaré?
-O jacaré embaixo da cama.
A mulher frívola e infiel dá um grito abafado. O reacionário diz:
-Não há jacaré nenhum embaixo da cama.
O doido faz uma cara de triunfante e pergunta:
-Se não há jacaré embaixo da cama, então o que é que está em silêncio?
A lógica do argumento é inatacável. E, a julgar pelo tamanho do silêncio, o jacaré é enorme.
-Por que será que ele está quieto? – pergunta o reacionário.
-Não sei – diz o doido. – A não ser que ele tenha comido alguém...
A mulher frívola e infiel leva as mãos à boca mas deixa escapar um nome:
- Danilo!
- O quê? – dizem o reacionário e o doido juntos.
- Nada, nada...
Mas ela desaparece sob o lençol para chorar seu amante. Danilo, comido por um jacaré embaixo da cama! E com o pijama novo que ela lhe deu.
- O jacaré deve ter comido o comunista – diz o reacionário.
- Que comunista?
- Tem sempre um comunista debaixo da cama.
- Depois eu é que sou doido...Não tem comunista nenhum debaixo da cama.
- Se o jacaré comeu, não tem mesmo.
-Só há uma maneira de sabermos o que realmente aconteceu – diz o doido, sensatamente. Olharmos debaixo da cama.
Os dois espiam embaixo da cama e vêem um moço de pijama novo, que sorri sem jeito.
O reacionário endireita-se na cama e começa a refletir. Olha para o doido, depois olha para sua mulher que chora. Aos poucos, vai se dando conta da situação.
- Meu Deus! – exclama.
- O quê? – diz o doido, pensando que é com ele.
- O comunista comeu o jacaré!
LFV
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