Wednesday, July 20, 2005

O estado dos livros

Ganhei os Contos reunidos do Rubem Fonseca no Natal de 94 ou 95: tinha, portanto, 11 ou 12 anos. Li-o logo depois, a maior parte durante férias de família para algum Estado nordestino repleto de praias - Bahia? Ceará? Ele deve ter passado muito tempo na mala ou na mochila, porque acho que começa daí sua deterioração.

Hoje, mesmo após uma restauração meio fajuta pouco antes da virada do milênio, meu livro está com uma aparência lastimável. A capa (elegante, toda preta com o nome do autor em vermelho algo rosado e o título em cópia da letra manuscrita do autor) se descolou da lombada, o que faz com que a última penda para fora da estante, salva do suicídio apenas pela força da costura na contracapa; a pintura preta da capa está corroída em vários lugares, especialmente nos vértices do livro; o alto das páginas, após tanto tempo à exposição da umidade no sótão que é o meu quarto, está cheio de manchas amareladas. Uma lástima. Mas.

Mas ninguém tem dúvida, olhando para aquele livro todo troncho na minha estante, de que foi um livro lido. E relido. Não com descaso ou desatenção: de forma devota, obsessiva, tarada. É um livro desgastado como desgastado é um playboy de 80 anos que passou a vida varando a noite em festas regadas com o melhor uísque que o dinheiro pode comprar, arrasado como o maratonista campeão segundos após rasgar a faixa que marca a linha de chegada. Um livro que cumpriu sua missão. E, capas rasgadas e lombadas suicidas à parte, ele permanece a postos, pronto para a batalha. Orgulho da biblioteca, um exemplo para seus pares.

1 Comments:

Blogger Werner Daumier-Smith said...

Rapaz, belo post, é isso mesmo. Tenho um baita orgulho do meu Arco Íris da Gravidade todo arrebentado, sinal de que eu li e reli, e ele ainda tem umas areias soltas, orelhas formadas na mochila, manchas na capa, páginas com sujeiras, uma maravilha, orgulho total pra mim e pra ele. Ao mesmo tempo olho pro meu Moedas, Bancos e Mercados Financeiros, do Mischkin (não o príncipe russo, que fique claro, mas o economista de sei-lá-que-faculdade-americana), novinho, inteirinho, isolado num canto, e imagino aquela criança chata, limpinha, mimada, que não fala com ninguém porque ninguém quer falar com ela, e ela envelhece chata, limpa, um horror, penso logo em Veruca Salt.

7:20 AM  

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